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ARTIGOS DE OPINIÃO
O grande negócio da Nanotecnologia.
Pobres alquimistas. Passaram a Idade Média em laboratórios iluminados por velas, trabalhando para criar xaropes miraculosos e transformar metais comuns em ouro ou prata. Falharam estrondosamente. No alvorecer da Revolução Científica, pesquisadores equipados com microscópios fundaram a química moderna - e repudiaram a alquimia. Mas acontece que os alquimistas estavam apenas uns poucos séculos adiantados. Hoje, em laboratórios cintilantes, equipados com microscópios poderosos, cientistas de três continentes estão prometendo novos materiais e medicamentos que deixariam os alquimistas orgulhosos. Esse trabalho está ocorrendo no ramo da nanotecnologia, o menor estágio da indústria. A unidade de medida padrão, o nanômetro, representa 1 bilionésimo de metro - o tamanho de 10 átomos de hidrogênio enfileirados. Nesse universo, dramas inteiros podem ocorrer na ponta de um alfinete, e um espirro tem a força de um furacão. Por que tão pequeno? Pesquisadores descobriram que nessa escala diminuta a matéria sempre se comporta de maneira muito diferente. Embora parte da ciência por trás desse fenômeno ainda esteja encoberta em mistérios, seu potencial comercial está atraindo cada vez mais atenção. Materiais familiares - do ouro à fuligem de carbono - revelam novas e surpreendentes propriedades. Alguns transmitem luz ou eletricidade. Outros se tornam mais duros que diamantes ou se transformam em potentes catalisadores químicos. E mais: pesquisadores descobrem que uma minúscula dose de nanopartículas pode transformar a química e a natureza de coisas muito maiores, criando de pára-lamas reforçados a células de combustível supereficientes. Agora é a hora de começar a ganhar dinheiro. Ao longo de 2005, grandes e pequenas empresas estarão tirando dos laboratórios produtos baseados na nanotecnologia e lançando-os no mercado. Os consumidores vão encontrar a nanotecnologia nos Hummers, os jipes usados pelo Exército americano, nas raquetes de tênis Wilson e até em bolas de golfe desenhadas para "voar" em linha reta. Enquanto isso, os investidores vão deparar-se com uma série de anúncios audaciosos. Em 1º de fevereiro, por exemplo, a gigante dos computadores Hewlett-Packard (HP) anunciou uma inovação na nanotecnologia que, dentro de uma década, poderá levar os computadores de hoje para além do silício e dos transistores. "Estamos reinventando o computador na escala molecular", diz Stan Williams, um alto executivo da HP. Por enquanto, a nanotecnologia está começando de forma modesta. Os maiores mercados para as nanopartículas estão em produtos familiares, da borracha usada na fabricação de pneus, uma indústria de US$ 4 bilhões, à prata usada na fotografia tradicional. A Lux Research, uma consultoria de Nova York especializada em nanotecnologia, estima que apenas US$ 13 bilhões em produtos manufaturados vão incorporar a nanotecnologia este ano. Isso é pouco mais que um erro de arredondamento na economia global. Mesmo assim, novos produtos baseados na nanotecnologia que poderão ter um impacto muito maior, estão a apenas um ou dois passos. Nos próximos dois anos, máquinas de diagnósticos com componentes construídos na nanoescala deverão permitir aos médicos e enfermeiros carregar laboratórios do tamanho de um copo de chope em suas valises. Nanosensores vão varrer aeroportos e agências dos correios em busca de antraz e do gás sarin. Mais para o fim da década, segundo apostam cientistas, novas memórias de computador compostas de nanopartículas poderão armazenar o acervo da Biblioteca do Congresso dos Estados Unidos em uma máquina do tamanho de um ioiô. Nesse ponto, prevê a Lux, as nanotecnologias terão aberto seu caminho em um universo de produtos avaliado em US$ 292 bilhões. Como a nanotecnologia evoca tamanhas surpresas? A natureza fornece exemplos dessa mágica molecular. Pense no carvão se comprimindo ao longo de milênios para criar os diamantes. As gemas são feitas dos mesmos átomos de carbono. Mas elas foram comprimidas, ao longo do tempo, em padrões ordenados de cristal ligados por laços químicos superfortes. O que é mole se torna duro. A escuridão fuliginosa se transforma em claridade reluzente. Hoje em dia, os cientistas podem realizar essas transformações entre dois cafezinhos. Com sondas atômicas eles manipulam as moléculas, superando a Mãe Natureza. O ramo da nanotecnologia proporciona aos cientistas surpresas até mesmo na velha tabela periódica dos elementos químicos - e eles estão registrando uma enxurrada de patentes para reclamar para si esses materiais miraculosos. As perguntas sobre a nanotecnologia não são mais de onde ela vem ou se ela é real, e sim de quão grande ela será. Alguns vêem a nanotecnologia como uma nova revolução dos materiais, semelhante ao alvorecer da era dos plásticos. Outros anunciam uma transição tão dramática quanto a passagem da humanidade da Idade da Pedra para a Idade do Bronze. Mas, previsões nebulosas à parte, as perguntas que estão ecoando dos laboratórios em Tóquio aos escritórios dos vendedores a descoberto de Wall Street dizem respeito ao dinheiro. Quais nanotecnologias irão criar novas fortunas, setores e campeões corporativos? A atividade no terreno é febril. Cerca de 1.200 empresas surgiram no setor, ao redor do mundo, metade delas nos Estados Unidos. Corretoras como a Merrill Lynch e a Punk, Ziegle & Co. estão vasculhando os mercados em busca de companhias voltadas para a nanotecnologia que possam fazer parte de índices de ações do setor. Enquanto isso, investidores divididos entre o fascínio do novo mercado e o temor de uma bolha parecida com a pontocom, lutam para compreender exatamente o que a nanotecnologia significa para eles. Essa confusão é compreensível. A nanotecnologia não é um setor individual, mas uma escala de engenharia que envolve matérias que vão de 1 a 100 nanômetros. Ao invés de um novo fenômeno, como a Internet, a nanotecnologia oferece novas possibilidades para milhares de materiais que já existem. Isso significa que grande parte da atividade inicial provavelmente vai ocorrer nas gigantes industriais. Dezenove das 30 empresas que fazem parte dos índices de ações Dow Jones Industrial já lançaram iniciativas na área de nanotecnologia. Como essas moléculas diminutas criam novos e grandes produtos? Às vezes, o tamanho, sozinho, é a chave. Tome por exemplo o Voltron, um revestimento de fios superdurável da DuPont usado em motores elétricos pesados. Se você olhasse para as gerações anteriores desses revestimentos por meio de um microscópio poderoso, os componentes químicos iriam parecer frouxamente agrupados, com espaços irregulares entre as moléculas. Esse tipo de estrutura leva o material a quebrar mais facilmente. As partículas em nanoescala do Voltron preenchem muitos dos espaços, tornando-o um isolante mais forte e de maior durabilidade. Em testes realizados pela DuPont com motores elétricos, um revestimento de Voltron aumentou o tempo entre as falhas em um fator de 10, para mais de 1.000 horas. E como esses motores consomem estimados 65% da energia elétrica dos EUA, a ampliação de sua eficiência e tempo de vida prometem grandes economias de energia. "Essa combinação química pode ser feita somente com nanomateriais", diz Krish Doraiswany, um gerente de planejamento da área de pesquisa em nanotecnologia da DuPont. A maioria dos avanços iniciais na nanotecnologia vai melhorar o que já temos. Exemplos: uniformes do exército que pesam muito pouco e podem resistir a armas químicas; embalagens para alimentos desenhadas para manter aquela verdura do mês passado verde e crocante. Será que a nanotecnologia vai fazer jus ao potencial de criar novos setores inteiros e novos gigantes corporativos? A resposta depende de como os jogadores, de autoridades reguladoras a empresários, irão lidar com uma série de desafios espinhosos. Os governos precisam elaborar regulamentações inteligentes que controlem os novos materiais e terapias. As empresas enfrentam problemas logísticos, como realizar o controle de qualidade na produção de minúsculos nanotubos de carbono e cristais de silicone, que são praticamente invisíveis. Essa indústria incipiente também precisa estabelecer padrões e práticas de execução que hoje não existem. Um estudo de 2004 da Lux Research constatou que muitos dos 200 fornecedores globais de nanomateriais básicos não conseguiram entregar o que prometeram no período. A conclusão? Enquanto o setor não estabelecer uma rede qualificada de fornecimento, apenas os inovadores trabalhando com laboratórios de categoria mundial poderão contar com materiais confiáveis. Isso limita o acesso à nanotecnologia e prejudica seu crescimento. Um desafio ainda maior para as indústrias de nanotecnologia é garantir que seus materiais são seguros para o corpo humano e para o meio-ambiente. Contratempos poderão derrubar as empresas de nanotecnologia e até mesmo levar a uma reação mundial dos mesmos ativistas que condenam os alimentos geneticamente modificados. Essas preocupações atordoam os mercados de ações. No terceiro trimestre de 2004, cerca de uma dúzia de companhias de nanotecnologia estavam se preparando para abrir o capital. Mas a mais aguardada abertura de capital do setor no ano passado - uma emissão de US$ 115 milhões em ações da Nanosys em agosto -, foi cancelada no último minuto, depois que os investidores perceberam que estavam se deparando com uma companhia rica em patentes, mas que ainda levaria anos para ter lucros. Agora, o mercado de abertura de capital parece estar estagnado, até mesmo para "estrelas" como a Nanofilm, uma lucrativa fabricante de filmes óticos de Valley View (Ohio), e a Konarka Technologies, uma líder na área de painéis solares plásticos de Lowell (Massachusetts). Dúvidas e confusão permeiam o mercado, onde até mesmo a definição de nanotecnologia está aberta ao debate. Quando analistas da Merrill Lynch anunciaram seu Nano Index, em abril, com 25 companhias, os críticos gritaram que a corretora estava alimentando o burburinho - e que algumas companhias farmacêuticas haviam sido incluídas na lista simplesmente porque se engajaram na prática de produzir moléculas. A Merrill refez a lista, limitando-a a companhias que declararam um compromisso público com a nanotecnologia. No atual clima de cautela, os investidores estão menos concentrados em visões deslumbrantes e mais em companhias com produtos, clientes e lucros reais. A empresa de melhor desempenho no índice da Merrill em 2004 foi a MTS Systems Corp., uma companhia de testes de equipamentos criada há 39 anos, cujas ferramentas são amplamente usadas em laboratórios de nanotecnologia. Sua ação teve valorização de 80%. Mas a maioria das empresas que vendem produtos nanotecnológicos de verdade, da companhia de materiais Altair Nanotechnologies à fornecedora de materiais médicos Flamel Technologies, da França, sofreram quedas em 2004. E o índice da Merrill Lynch caiu outros 12% em janeiro deste ano. Não há dúvidas de que a nanotecnologia dará seus tropeços. Mesmo assim, ela vai mudar tudo que o estiver em seu caminho. Para os empresários, a nanotecnologia significa recursos. Capitalistas de risco já investiram US$ 1 bilhão em empresas do ramo, quase metade disso nos últimos dois anos. Enquanto isso, os recursos governamentais estão firmes em US$ 4,7 bilhões ao ano, divididos quase igualmente entre Ásia, Europa e América do Norte. O dinheiro está entrando em laboratórios de universidades e em novos corredores de nanotecnologia que vão de Albany (EUA) a Xangai (China) e Fukuoka (Japão). Muitos dos exploradores iniciais estão se concentrando em ferramentas de testes na área de cuidados com a saúde, que é bem menos regulamentada que as áreas de medicamentos e terapias. A LabNow, uma companhia iniciante de Austin (Texas), está concentrada na AIDS. Usando canais e sensores minúsculos, a companhia desenvolveu um laboratório sanguíneo em um chip do tamanho de um cartão de apresentação. O paciente coloca uma gota de sangue sobre o chip, que então é inserido em um pequeno leitor eletrônico. Em minutos, os pacientes com AIDS recebem a contagem dos glóbulos brancos no sangue - uma medida crucial no tratamento contra a doença. Atualmente esse teste leva semanas ou meses para ser realizado em regiões mais pobres do planeta. Os pacientes podem morrer enquanto esperam os resultados. Mais inovações dramáticas são esperadas para os próximos dois a três anos, na medida em que empresas forem desenvolvendo novos procedimentos médicos que começam a emergir do labirinto regulatório. Mas versões "nanoizadas" de medicamentos existentes já estão provocando alvoroço. No mês passado, as ações da American Pharmaceutical Partners Inc. subiram 50% por causa das notícias de que a Food and Drug Administration (FDA) havia aprovado a comercialização do Abraxane, um medicamento à base de proteína em nanoescala para o tratamento de metástase de câncer no seio. A versão nanotecnológica pode agir em partes do corpo que as versões atuais não podem sem provocar efeitos colaterais intoleráveis. Pesquisadores também estão trabalhando em tratamentos personalizados, como os de nanopartículas construídas para reproduzir o perfil genético único das células cancerígenas de um paciente - e programadas para encontrá-las e destruí-las. Centenas dessas terapias estão em andamento. A maioria vai fracassar. Mas, mesmo que um punhado delas seja bem sucedido, elas poderão mudar a medicina. Para obter tais triunfos, as companhias de nanotecnologia precisam afastar os temores sobre os efeitos das partículas no organismo. As preocupações aumentaram no segundo trimestre de 2004, quando pesquisadores da Southern Methodist University anunciaram a ocorrência de danos cerebrais em uma perca mantida em um aquário alimentado com nanopartículas à base de carbono. Embora longe de conclusivas, tais descobertas levantam sinais de alerta no mundo todo - e estes vão muito além das legiões de ativistas. No ano passado, a gigante dos resseguros Swiss Reinsurance alertou para a corrida da nanotecnologia, citando "a natureza imprevisível dos riscos que ela envolve e as perdas recorrentes e cumulativas a que ela poderá levar". Um setor que poderá utilizar o potencial da nanotecnologia sem esses riscos potenciais é o de semicondutores. Com os circuitos e ligações dos chips ficando cada vez menores, os fabricantes começam a ter problemas. Com o setor lutando para manter a Lei de Moore, que prevê a duplicação da potência dos computadores a cada 18 meses, os custos estão explodindo. O preço de uma nova fábrica para a produção de semicondutores está projetado para alcançar US$ 10 bilhões até o fim da década. Nota do Managing Editor: Essa matéria, assinada por Stephen Baker e Adam Aston, da revista Business Week, foi traduzida por Mário Zamarian e publicada em Valor Econômico (http://www.valoronline.com.br), seção Empresas & Tecnologia, em 18 de fevereiro de 2005. |
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