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Brasil pode produzir remédio contra Aids (Sida) em 10 meses, estima
Ministério.

O Ministério da Saúde prevê dez meses para o início da produção do Kaletra, a droga anti-retroviral usada no tratamento de Aids, caso não haja acordo com a farmacêutica Abbott. "Em seis meses, o laboratório Farmanguinhos conseguirá produzir porque tem tecnologia e, com os testes de bioequivalência e biodisponibilidade, soma-se mais um a dois meses. "No máximo, em dez meses, poderemos começar a produzir", disse o secretário de vigilância sanitária do Ministério da Saúde, Jarbas Barbosa.

Com portaria ministerial declarando o remédio como de "interesse público", que deve ser publicada nesta segunda-feira (27 de junho) no "Diário Oficial", o laboratório farmacêutico americano terá dez dias para decidir se reduzirá o preço do lopinavir/ritonavir, a substância ativa do Kaletra. Caso a Abbott não aceite, o governo poderá usar, pela primeira vez, um mecanismo de licença compulsória, que permite repassar a terceiros a autorização para a fabricação do remédio. Em outras palavras, a quebra de patente.

A Abbott, que tem a proteção da patente do medicamento no Brasil até 2012, receberia em troca royalties de 3%. Em nota, o laboratório informou estar "desapontado" com a decisão do governo brasileiro. Mas acrescentou que continua "a desejar trabalhar com o governo, para encontrar uma solução de comum acordo". Não disse, contudo, se aceitará a proposta.

O Kaletra, um inibidor de protease, foi lançado nos EUA em 2000, criando uma nova categoria de medicamentos no combate à Aids. Em 2004, gerou vendas de US$ 247 milhões para a Abbott, sendo US$ 134 milhões fora dos EUA. Desde 2001, ele integra o coquetel de medicamentos contra Aids do programa brasileiro.

Boa parte da discussão envolve preço. Segundo o ministério, o valor cobrado hoje pelo Kaletra é de US$ 1.17 por comprimido, abaixo dos US$ 1.60 cobrado em 2002. Mas, de acordo com o ministério, essa redução de 26% ficou aquém dos descontos obtidos pelo governo com outras negociações de preços de drogas do coquetel de antiaids, que somam algo entre 75% e 80%. A versão genérica sai por US$ 0.72, segundo o ministério.

O argumento do Ministério da Saúde para a quebra de patente é pela garantia da sustentabilidade do programa antiaids. A estimativa é que a fabricação local pouparia R$ 130 milhões, metade do que é gasto com o medicamento da Abbott. O custo com o Kaletra subiu de US$ 35,2 milhões em 2002 para US$ 91,6 milhões (R$ 257 milhões) em 2005 enquanto o total de pacientes passou de 3,2 mil pessoas em 2002 para 23,4 mil pessoas neste ano.

O governo alega que vem ampliando o orçamento do programa de Aids que aumentou para R$ 945 milhões - alta de 52%. Nas projeções do ministério, em 2008 o orçamento pularia para R$ 1,25 bilhão para atender 215 mil pacientes. "Não teremos mais dinheiro se os gastos crescerem nesse ritmo e nossa intenção é introduzir novas drogas no coquetel, como o Fuzeon (da Roche)", disse Barbosa.

Nas contas de Farmanguinhos, o preço justo do comprimido do Kaletra seria cerca de US$ 0,68, levando em consideração a importação dos princípios ativos chineses e indianos. "Não queremos o preço da África (US$ 0,22 por comprimido), mas um preço ao redor do vendido na China e Índia". Segundo Barbosa, o Farmanguinhos e laboratórios privados têm tecnologia para produzir o medicamento.

A disputa entre o governo brasileiro e o laboratório Abbott se arrastava há meses. Além da redução de 26%, a farmacêutica havia sinalizado a produção local do Kaletra em sua fábrica no Rio de Janeiro. A proposta foi recusada pelo governo. "Isso não significa nada, só iria gerar o imposto local. Mas o preço oferecido por eles continuaria o mesmo. O Ministério da Saúde compra remédio", disse Barbosa.

Nota do Managing Editor: Esta matéria foi primeiramente veiculada no jornal Valor Econômico, Caderno 1, de 27 de junho de 2005.

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