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DIVULGAÇÃO

Rede de pesquisa tentará simular, e solucionar, desafios do pré-sal.


A Petrobrás iniciou anteontem o primeiro teste de longa duração para exploração de óleo da camada do pré-sal no campo de Tupi, na Bacia de Campos. O navio-plataforma FPSO BW Cidade de São Vicente ficará ancorado a 290 quilômetros da costa, extraindo 14 mil barris de petróleo por dia, durante 15 meses, de um poço aproximadamente 6 mil metros abaixo da superfície. O experimento servirá para estudar as condições reais de produção petrolífera em águas ultraprofundas do pré-sal.




Navio-plataforma FPSO BW Cidade de São Vicente.

Créditos: Petrobras.


Mas não é só no mar que as coisas estão ocorrendo. Em terra, pesquisadores de várias instituições trabalham também a todo vapor para montar uma das maiores redes de computação do mundo, capaz de reproduzir em um ambiente virtual científico as condições extremas de trabalho a que as plataformas oceânicas serão submetidas no futuro. Coisas como ondas gigantes, tempestades, correntes marítimas, temperaturas extremas, pressões capazes de esmagar uma bola de basquete e - talvez o maior desafio de todos - uma camada de 2 km de rocha salina que adora sufocar brocas e tubulações.

Para ter qualquer chance de sobrevivência nessas condições em alto-mar, toda a infraestrutura petrolífera do pré-sal terá de passar ilesa, antes, por elas nos computadores e tanques de provas dos cientistas em terra firme. É para isso que está sendo criada a Rede Galileu, um consórcio de cinco laboratórios acadêmicos, financiados pela Petrobras e conectados por uma rede de computadores com capacidade para realizar 180 trilhões de operações por segundo (teraflops).

"São condições muito desafiadoras, que nunca foram simuladas antes", diz o professor Kazuo Nishimoto, do Departamento de Engenharia Naval e Oceânica da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP). Ele é o coordenador do atual Tanque de Provas Numérico (TPN) da instituição, que opera com um cluster de 2 teraflops, num espaço físico de 300 metros quadrados. Graças ao projeto Galileu, o laboratório será transferido ainda neste ano para um novo prédio de 1.800 m2, turbinado com um cluster de 25 teraflops - e capacidade para chegar a 55 teraflops.

A rede toda, quando estiver operando em capacidade máxima, terá calibre computacional para processar até 180 teraflops de informação. Segundo Nishimoto, é o maior grid desse tipo no Brasil, e um dos maiores no mundo. Os outros nós do consórcio são o Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), a Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe/UFRJ), a Pontifícia Universidade Católica do Rio (PUC-Rio) e a Universidade Federal de Alagoas (UFAL). O plano é que os cinco laboratórios sejam inaugurados em outubro, 100% operacionais. Outras nove instituições participam como "subsatélites" da rede.


Especialidades

O logo do projeto é emblemático: mostra cinco planetas, simbolizando as universidades, circulando em torno de um sol, simbolizando a Petrobras, que financia quase todo o projeto. Só o laboratório da USP custou cerca de R$ 10 milhões. O dinheiro vem da Lei de Participação Especial, aprovada em 2006 pela Agência Nacional do Petróleo (ANP), segundo a qual 1% da receita oriunda dos campos produtivos da Petrobrás deve ser aplicada em pesquisa e desenvolvimento tecnológico - metade (0,5%) fora da empresa.

Cada núcleo da rede terá um foco de trabalho diferenciado, determinado pela especialidade de suas equipes. Na Ufal, por exemplo, serão desenvolvidos sistemas computacionais de apoio à perfuração de poços em camadas salinas.

"Essas camadas têm uma série de peculiaridades em suas características físicas que as diferenciam das rochas normais que estamos acostumados a perfurar", diz o engenheiro Eduardo Setton, coordenador do Laboratório de Computação Científica e Visualização (LCCV) da Ufal e representante da rede na instituição alagoana.

Os desafios que se escondem debaixo d'água são dignos de um filme de ficção científica. No ponto onde o Cidade de São Vicente está ancorado, por exemplo, a lâmina d'água é de 2.140 metros - o que significa que o leito marinho está mais de 2 km abaixo da superfície, muito mais fundo do que qualquer poço já explorado pela Petrobrás. Só isso já seria um problemão. Mas é só o primeiro passo.

Para chegar ao tão cobiçado óleo de Tupi, ainda será necessário perfurar mais uns 1.500 metros de rocha e outros 2.000 metros de uma camada de sal compactado. É debaixo dessa crosta salgada que o petróleo está aprisionado, em reservatórios que podem chegar a 7.000 metros de profundidade.

A camada salina é especialmente traiçoeira porque o sal, pressionado e aquecido pelo calor interno do planeta, torna-se um material viscoso, parecido com uma gelatina superdensa. Isso significa que é mais fácil perfurá-lo, porém mais difícil manter o poço aberto e funcionando, porque o material se move. São condições inéditas, que os computadores do LCCV terão o desafio de simular com precisão científica. "O objetivo do sistema é dar apoio para diminuir o risco do processo de perfuração", afirma Setton.

O cluster do LCCV será expandido de 0,18 teraflops para 20 teraflops, e o laboratório ganhará um novo prédio de 1.700 m2. "O impacto desse projeto na nossa universidade será revolucionário, provavelmente muito maior do que nas outras instituições", avalia Setton.


Tecnologia 3D

Na superfície, apesar de ser um ambiente mais familiar, as coisas não são menos complicadas do que debaixo d'água. O fator mais preocupante são as ondas. O campo de Tupi está a 290 km da costa, bem mais distante que os outros, onde as condições de mar e clima são mais rigorosas. Imagine ter de manter uma plataforma estável num mar revolto, presa a dezenas de cabos e tubos rígidos de aço com mais de 2 mil metros de comprimento, presos ao fundo do mar e cheios de petróleo quente e gás altamente pressurizados.

A simulação caberá principalmente ao grupo de Nishimoto, na USP, especializado nas estruturas que ficam na lâmina d'água - desde a superfície até o leito marinho. As pesquisas serão feitas em dois tanques de provas: um "numérico", em que os projetos são simulados virtualmente no computador, e outro físico, chamado calibrador hidrodinâmico - um tanque de 900 mil litros de água, rodeado por um sistema inédito de pás que gera e absorve ondas de maneira extremamente controlada (ver ilustrações).

"Pegamos o melhor do físico, o melhor do numérico e fizemos uma combinação inédita no mundo", diz Nishimoto. No caso numérico, todas as simulações poderão ser visualizadas em três dimensões (3D), via sofisticado sistema de projeção que permitirá aos pesquisadores interagir com as imagens em tempo real, num ambiente de realidade virtual. Todos os centros da rede terão uma sala como essa. "Parece videogame, mas é uma ferramenta de pesquisa", diz Nishimoto. Todas as tecnologias do laboratório foram criadas no Brasil.


Nota do Managing Editor: esta matéria, de autoria de Herton Escobar, foi primeiramente veiculada no site www.estadao.com.br, em 03 de maio de 2009. A ilustração que figura na notícia não faz parte da matéria original, tendo sido obtida em www.google.com.br.


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