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Doença inesquecível.


Apenas cerca de 10% dos gastos com pesquisa em saúde feitos no mundo têm por objeto os males que afetam 90% da população mundial, como a malária. Os médicos que combatem essas "doenças esquecidas", ou "negligenciadas", têm de se contentar com um arsenal de remédios e técnicas de diagnóstico em grande medida ultrapassado e ineficaz. As 35 mil pessoas que elas matam -por dia- vivem e morrem em países pobres, invisíveis nos planos de negócios da indústria farmacêutica.

Há sinais, porém, de que esse estado de coisas deplorável começa a mudar. No final de maio, Brasil e Quênia viram aprovada na Assembléia da Organização Mundial da Saúde (OMS) sua moção para criar um grupo dedicado a impedir que tais enfermidades permaneçam no esquecimento. No dia 2, o Brasil anunciou um novo e promissor passo nessa direção em seu território.

Os ministérios da Saúde e da Ciência e Tecnologia lançaram um edital para a seleção de propostas para pesquisa de doenças negligenciadas: dengue, mal de Chagas, hanseníase, leishmanioses, malária e tuberculose. Recursos de até R$ 20 milhões poderão ser carreados para os projetos eleitos na seleção por mérito a cargo do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Tal iniciativa de orientar e induzir a pesquisa científica deve ser saudada não tanto pela cifra envolvida, insignificante em termos internacionais (empresas farmacêuticas alegam que cada medicamento inovador custa US$ 800 milhões de investimento em pesquisa), mas pelo potencial de impacto social. Um potencial que não pode ser exagerado, ao contrário do que se fez com duas iniciativas dos mesmos ministérios voltadas para pesquisa com células-tronco, uma simples promessa agraciada com um total de R$ 24 milhões.

Com exceção da dengue, que viu o número de casos dobrar de 124 mil para 242 mil de 2004 para 2005, as outras moléstias se encontram de certa maneira controladas. Todas, porém, castigam desproporcionalmente as regiões mais pobres do país.

O mal de Chagas teve o total anual de novos casos reduzido, em 30 anos, de 100 mil para estimados 20 mil, com insetos como o barbeiro erradicados de uma dezena de Estados. Agora, ressurge como ameaça na Amazônia (tópico destacado no edital).

A incidência de hanseníase caiu a um quarto (hoje é de 4,52 para 10 mil brasileiros) em menos de 20 anos, tão rápido quanto o abandono da designação pejorativa "lepra", mas permanece como flagelo tipicamente amazônico, pois as regiões Norte e Centro-Oeste apresentam taxas até dez vezes maiores que no Sul.

A leishmaniose visceral castiga muito o Nordeste (74% dos casos), enquanto a tegumentar divide parcela similar (73%) entre Norte e Nordeste - e ambas revelam alguma tendência para crescer. A ressurgência da malária (410 mil casos em 2004), outra doença predominantemente amazônica (99% das ocorrências), e a persistência de cerca de 85 mil casos novos de tuberculose a cada ano, principalmente em associação com Aids, também dão motivo para preocupação.

No Brasil ou no mundo, esses flagelos erradicáveis, ou pelo menos controláveis, não podem e não devem permanecer negligenciados - muito menos pela comunidade científica, único setor capaz de desenvolver novas armas para combatê-los.


Nota do Managing Editor: editorial publicado pelo jornal Folha de São Paulo, de 26 de junho de 2006.

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