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INSTITUTO DO MILÊNIO DE MATERIAIS COMPLEXOS (IMMC)
O atual estágio de desenvolvimento científico da Química apresenta algumas características interessantes, que devem ser lembradas no contexto deste Instituto. A Química atravessa um momento de vigoroso crescimento, devido à introdução recente de novas ferramentas e de conceitos poderosos, ao mesmo tempo em que a indústria química passa por um processo de grande mudança, valorizando os produtos com maior conteudo científico, em uma escala sem precedentes. A indústria química enfrentou a partir dos anos 60, em todo o mundo, muitas dificuldades perante governos e o público, devido aos seus próprios erros. Essa situação levou a uma profunda mudança nos port-fólios de P&D das empresas, com o desaparecimento de algumas linhas de produtos e o crescimento de outras. Nos anos 90, no contexto da globalização e da emergência das biotecnologias, teve início um amplo processo de reorganização da indústria química mundial, que ainda prossegue. Esse processo consistiu em drásticas mudanças de orientação, com um grande crescimento de horizonte dos produtos biotecnológicos, em detrimento dos resultantes de processos químicos mais tradicionais, em setores como o de produtos para a saúde e agricultura. Apesar disso, a produção da indústria química de base e de especialidades seguiu crescendo em taxas iguais ou superiores as do crescimento geral da economia dos países desenvolvidos. Por outro lado, as tecnologias da informação estão criando um grande número de oportunidades para novos produtos químicos funcionais, que assumem um papel de liderança na fabricação de transdutores, memórias, telas e monitores, emissores de luz e som e deverão ser uma realidade como novos materiais semicondutores, em futuro próximo. Persiste uma demanda crescente dos setores de saúde, alimentação, transportes e construção civil por novos produtos químicos cada vez mais sofisticados. Tal demanda tem sido respondida por desenvolvimentos muito rápidos, viabilizados pelos progressos em simulação e modelagem, em síntese (em especial, a combinatória), em metodologias de ensaio e avaliação de alta produtividade (high-throughput screening) e, principalmente, por uma crescente integração entre as demandas e as ofertas de novo conhecimento. Numa perspectiva mais estritamente científica, vivemos uma fase de grandes mudanças, que alguns não hesitam em afirmar como uma fase de mudança de paradigma, no sentido de Kuhn - e isso ocorre dentro de toda a Ciência e toda a atividade científica. Os fatores são múltiplos, mas pode-se destacar dois: o crescimento das ciências da complexidade, e o impacto das tecnologias da informação. A Complexidade tem perturbado grandemente algumas disciplinas científicas, em particular a Física e todas as ciências da Engenharia [1]. O seu impacto sobre a Matemática foi impressionante, simplesmente porque na área dos Sistemas Complexos se criou a experimentação em Matemática. No caso da Biologia, Sistemas Complexos captaram especialmente a atenção de ecologistas. Entretanto, a desatenção à Complexidade explica a recente frustração de muitas pessoas com o fato de o genoma humano não ser totalmente ou marcadamente diferente do genoma de bactérias. A (relativamente) pequena diferença entre o genoma da espécie humana e o de outras espécies pode surpreender aos que sempre deram excessiva importância à informação e aos primeiros princípios, enquanto elementos de domínio e compreensão do mundo material e, portanto, surpreendeu também aos que acreditam excessivamente nas hierarquias de teorias e de disciplinas científicas [2]. Entretanto, não surpreende aos biólogos e bioquímicos que já anunciavam que o domínio do Genoma tornaria ainda mais importante conhecer o Proteoma, para que houvesse o efetivo domínio de funções. Contrariamente, a Complexidade não surpreende aos químicos, porque estes sempre conviveram com ela, como destaca Whitesides [3]. Podemos dizer que o mundo científico chegou nos últimos vinte anos, pelo caminho da complexidade, exatamente ao território que os químicos sempre habitaram. Nesse território a Química se desenvolve com crescente vigor, graças também às novas ferramentas formais dos próprios sistemas complexos e graças à crescente acumulação de conhecimento realizada em todo o século 20, particularmente nas suas últimas décadas. A idéia de molécula, que foi bem desenvolvida pelos químicos durante o século 19 e só no século 20 foi amplamente adotada nas outras áreas da ciência, evoluiu no século 20 até às macromoléculas e supramoléculas. Por sua vez as noções de auto-ordenamento e de estruturas fora de equilíbrio, e sucessos importantes na teoria e na metodologia computacional permitiram o trato de sistemas cada vez mais como complexos, como as nano e mesoestruturas, os compósitos, os catalisadores e outros sólidos, e todas as classes conhecidas de matéria "mole" e "dura". No limite oposto, dos sistemas químicos mais simples, a dinâmica química torna-se conhecida em grande detalhe, experimental e teoricamente. Todas estas idéias e ferramentas hoje geram novos conceitos, produtos e dispositivos em um ritmo frenético, fazendo da Química de Materiais uma das mais ricas fronteiras científicas e tecnológicas da atualidade. Essa fronteira se comunica com todas as ciências da matéria e da vida, e com todas as áreas tecnológicas, uma vez que as novas tecnologias mantêm sua estrita dependência de novos materiais, sejam os previamente desenhados e planejados para desempenharem uma função específica ou um conjunto de funções, sejam os descobertos por serendipitia. A Química de Materiais é portanto uma grande oportunidade de trabalho, e uma vigorosa ferramenta de todo o desenvolvimento científico e tecnológico. Um fator importante na formação de um Instituto do Milênio está na qualidade das pessoas envolvidas e num compromisso comum de busca de excelência. Este tipo de filosofia certamente está acima do que as Instituições individuais representadas neste grupo conseguem estabelecer devido a heterogeneidade do seu corpo docente, principalmente nas idéias sobre a função e papel das universidades. Partimos do princípio que a formação de um Instituto de Excelência possa servir como pólo irradiador de idéias, de atuação, e de modelo de centros de pesquisa de qualidade, no qual outras Instituições, em função do seu sucesso, possam vir a se moldar no futuro O estabelecimento de um Instituto do Milênio certamente permitirá um aumento da capacidade dos pesquisadores individuais envolvidos. Através deste Instituto pretende-se a integração dos pesquisadores que, apesar de pertencerem todos à área de Química, possuem diferentes formações. Assim teremos interações cooperativas entre químicos teóricos e experimentais e, entre diferentes especialidades: físico-química orgânica e inorgânica, química inorgânica e materiais, físico-química e química analítica modernas, química teórica. Estarão em contacto temáticas modernas como: supramolecularidade, auto-organização, nanocompósitos, nanopartículas, topologia e modelagem molecular, fenômenos não-lineares, fenômenos de superfície, espectroscopias com resolução espacial e temporal, entre outras. Espera-se que a natureza complementar das diferentes expertises, de maneira articulada e conseqüente, levem à uma integração natural e desejável, que permita importantes ganhos nas atividades de pesquisa. É importante destacar que as instituições (UNICAMP, USP, UFPE e UFRJ) e os pesquisadores envolvidos têm larga tradição na formação de recursos humanos, como também, facilidades experimentais e computacionais complementares. O enfoque altamente interdisciplinar e as idéias inovadoras que serão desenvolvidas neste Instituto permitirão a formação de recursos humanos com capacitação para enfrentar os desafios científicos e tecnológicos que se apresentarão no futuro, levando a novos e importantes avanços. Isto significa que o Instituto não se esgota em sí mesmo, pois formará uma geração de pesquisadores com o entendimento da ciência como geradora das tecnologias portadoras do futuro as quais visam melhorar a qualidade de vida da sociedade como um todo. Além da abrangência geopolítica, caracterizada pela localização da sedes, das instituições que o Instituto manterá colaboração e dos grupos emergentes, situados em vários estados brasileiros, é importante destacar que a presença de forte conteúdo científico e tecnológico, somado à capacitação das pessoas são ingredientes fundamentais para a geração de atividade econômica e empregos.
[1] Science 284 (5411) 2 de abril de 1999. Número especial, contém vários artigos sobre Complexidade e Sistemas Complexos. Nota do Managing Editor: Este texto fez parte da Proposta do Instituto do Milênio de Materiais Complexos, aprovada pelo Ministério da Ciência e Tecnologia, em 2001. São pesquisadores seniôres do IMMC os seguintes professores: Fernando Galembeck, Oswaldo Luiz Alves, Célio Pasquini e Marcos Nogueira Eberlin (Instituto de Química, UNICAMP); Henrique Eisi Toma, Paulo Sérgio Santos e José Manuel Riveros Nigra (Instituto de Química, USP); Marco Antonio Chaer Nascimento (Instituto de Química, UFRJ); Gilberto Sá, Oscar Malta e Alfredo Simas (Departamento de Química Fundamental, UFPE). |
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