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NOVIDADES
Quando acendemos uma lanterna sobre a mão é possível perceber que a luz consegue atravessar alguns centímetros de pele. Será que essa luz pode ser usada para "enxergar" por dentro do corpo? Isso é possível utilizando-se um sistema chamado de Imageamento Óptico Difuso (DOI, na sigla em inglês), que não é invasivo e tem sido utilizado cada vez mais em neurociências. Trata-se de uma técnica de estudos ópticos que usa laser preferencialmente, mas também pode ser obtida, no caso de animais, com lâmpadas especiais e filtros. Equipamento de Imageamento Óptico Difuso colocado no couro cabeludo de voluntário. Créditos: Rickson Mesquita
Desde o final dos anos 1990, tem havido um aumento do número de pesquisas com óptica difusa em estudos de mapeamento cerebral. Basicamente, a idéia é fazer incidir uma luz laser de baixa potência sobre o couro cabeludo (escalpo) e detectá-la a alguns centímetros de distância. "Se o comprimento de onda da luz está na região do infravermelho próximo, então esta luz pode penetrar sobre o escalpo e atingir o córtex cerebral", explica Rickson Mesquita, aluno de doutorado do IFGW. O caminho percorrido pela luz depende da concentração de cromóforos (células com grânulos coloridos) na região, principalmente oxi-hemoglobina e deoxi-hemoglobina, que são frações das células vermelhas do sangue. A variação de concentração destes cromóforos faz a intensidade da luz no detector variar, e esta variação é utilizada para inferir a ativação cerebral em estudos funcionais cerebrais. Essa técnica é chamada de espectroscopia óptica no infravermelho. Além disso, também é possível acompanhar a dinâmica temporal da concentração desses cromóforos e localizá-los espacialmente no cérebro, por meio da tomografia óptica difusa. Comparada com outras técnicas utilizadas para este tipo de estudo, como a ressonância magnética funcional ou a tomografia por emissão de pósitrons, o DOI que será usado na Unicamp tem alta resolução temporal, da ordem de milisegundos, embora não consiga atingir uma resolução espacial tão boa quanto a ressonância magnética funcional. Hoje em dia, as bases dessa técnica estão bem definidas e a maior parte dos estudos tem se concentrado em explorar a boa resolução temporal, para estudar a dinâmica cerebral e relações neurovasculares. Segundo Mesquita, que trabalhou com o equipamento como pesquisador temporário no Hospital Geral de Massachusetts, nos Estados Unidos, em 2007, por se tratar de uma técnica relativamente simples, muito dinheiro tem sido investido no acoplamento de DOI com outras técnicas utilizadas em neurociência, como ressonância magnética funcional, eletroencefalografia ou magnetoencefalografia, permitindo assim medidas simultâneas com diferentes aspectos neurofisiológicos. "A junção de características como a alta resolução temporal do DOI com a alta resolução espacial de ressonância magnética funcional permite a análise de dados com qualidade não disponível com apenas uma técnica", explica. "Vários estudos têm se destacado nessa busca, principalmente porque isso pode significar uma maior clarificação do metabolismo cerebral, como o consumo metabólico de oxigênio durante uma atividade ou até mesmo estudos de auto-regulação cerebral, ou disfunções associadas, como epilepsia e derrames", diz. A literatura científica sobre imageamento óptico difuso aumenta a cada ano. Devido à alta resolução temporal e à possibilidade de realizar medidas intracranianas em animais como ratos, esta técnica vem sendo amplamente utilizada para estudar a relação neurovascular-metabólica em neurofisiologia. Estudos recentes demonstram a relação entre atividade neuronal e parâmetros vasculares, alguns deles tentando, inclusive, explicar sinais controversos em ressonância magnética. Por ainda não ser uma técnica clínica, todas as pesquisas envolvendo DOI são feitas em laboratórios de pesquisa em neurociências. Vários laboratórios do mundo contam com este tipo de equipamento, com destaque para locais que são referência no assunto, como o Hospital Geral de Massachusetts, a Universidade da Califórnia e a Universidade de Columbia, todos nos Estados Unidos, além de outros laboratórios na Europa, principalmente na Inglaterra e na Alemanha. Mesquita avalia que, por serem equipamentos exclusivamente de pesquisa - pelo menos por enquanto - e extremamente portáteis (não medem mais que 0,7 cm3), um único pesquisador bem treinado pode realizar medidas nessa área. Como também não são equipamentos caros - o preço de um equipamento destes varia entre US$ 70 mil e US$ 300 mil, aproximadamente - e a relação custo-benefício tem se mostrado alta, vários financiamentos têm sido fornecidos para o desenvolvimento de estudos com o DOI, dentre os quais se destacam os do National Institute of Health (NIH), principal órgão de fomento à pesquisa de saúde norte-americano, obtidos por diversos grupos de pesquisa daquele país, e investimentos de empresas privadas para a comercialização dos equipamentos. Esse tipo de sistema mostra-se promissor como uma ferramenta de uso clínico relacionado ao estudo da função cerebral. Pesquisadores já avaliam seu uso na prevenção e tratamento de convulsões e desordens psiquiátricas como a depressão, doença de Alzheimer e esquizofrenia. No Brasil, o Programa de Cooperação Interinstitucional de Apoio à Pesquisa sobre o Cérebro (CInAPCe), da Fapesp, prevê parte de sua verba destinada à Unicamp com o uso de um equipamento óptico, além de bolsas de estudo para alunos e pesquisadores que estudam aplicações em DOI. "Os principais projetos que pretendemos desenvolver, a partir do mês que vem, envolvem aplicações multimodais simultâneas em pacientes com epilepsia, além de estudos básicos da relação neurovascular", adianta Mesquita. Boletim Eletrônico ComCiência, 05 de maio de 2008. Nota do Managing Editor: esta matéria foi veiculada primeiramente no Boletim Eletrônico ComCiência (www.comciencia.br). O texto é de Nereide Cerqueira. |
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